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Um “diário” que nasceu como carta — sobre o PCB

Da ProleWiki, a enciclopédia proletária
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Um “diário” que nasceu como carta — sobre o PCB
Escrito em2022–2023
Publicado 1ª vez2023
FonteTexto no Medium

19 de setembro de 2022

Não é de hoje e nem novidade que o CR boicota a atuação dos coletivos e do PCB na Bahia. Inúmeras cartas, denúncias, reuniões etc apontaram e apontam isso, e a própria prática da direção do PCB Bahia não deixa esconder. Ano passado enviei uma carta apresentando críticas à prepotência política e postura antidemocrática do CR com a UJC, a partir das imposições e negação do debate. Anexo a carta no e-mail para que vocês possam ler o que me referia. Todas as questões ali presentes eu mantenho e reforço.

Em 2022 por questões políticas, pessoais e organizativas me desliguei da UJC e entrei no CNMO; em pouco tempo de coletivo, vejo que a postura do CR é a mesma — ou pior, vide o papel que tem na desarticulação da primeira comissão estadual de organização através da perseguição e expulsão de um militante do coletivo e do partido que gerou um grande desgaste interno, sendo um dos motivos que contribuíram para a saída de P e N (ambos também estavam no CR e eram os principais responsáveis pela organização do CNMO Bahia). Não presenciei e não estava nas instâncias onde os episódios aconteceram, mas tudo o que aconteceu é de conhecimento de muitos militantes. Muitos militantes sabem também que o CR se refere ao CFCAM da mesma forma, interferindo e desarticulando a atuação do coletivo.

Um dos pontos mais críticos da direção do PCB Bahia é a prática de desgaste sistemático e contínuo, provocando um nível de tensão desnecessário nas direções dos núcleos e coordenações estaduais, sobrecarregando psicologicamente figuras específicas das organizações. De um(a) a um(a), muitos quadros se desligaram ou foram praticamente descartados, gerando diversos problemas na continuidade de trabalhos, no desenvolvimento de outros — fora as situações pessoais de níveis bem graves. Se abrir uma sindicância e solicitar o relato de vários militantes ou ex-militantes muitos absurdos serão ouvidos. E não sou eu quem vou trazer aqui, pois sei que mesmo sabendo de muito, não vou ser desonesta em relatar coisas que não tenho autorização. Nem me escrevam solicitando que eu “prove”, como já foi feito quando enviei outra carta.

A tática mais utilizada é a conversa informal e pressão individual, com ares de bom mocismo e preocupação, disseminando críticas a figuras específicas ou a algum coletivo, tratando tudo como questões pessoais e o problema nunca é do CR. Até porque as direções não têm coragem de abrir o debate para o coletivo, furtando as instâncias de conhecerem as possíveis críticas políticas que o Comitê Regional tem, para não serem questionados.

Porém, basta ouvir as denúncias exaustivas de Ana Karen — que é praticamente colocada como a maior causadora de tensões, quando na verdade o CR sempre a perseguiu e contribuiu com o adoecimento da militante. Basta reler as cartas de desligamento e ouvir pessoas que saíram do CR como E, P, V, N e B. Ou perguntar o quanto os problemas do CR contribuíram com a saída de B, C, F, A, R. Basta dar atenção às críticas que pessoas que ainda estão organizadas têm.

Eu respeito muito a decisão de rompimento das pessoas que saíram, e respeito profundamente as pessoas que decidiram se manter. Não é fácil ver o trabalho político de uma organização tão importante deixar de ser feito por causa de perseguições, mandonismos e direções carreiristas e autoritárias. Eu já consigo prever as atitudes do CR perante minha carta e minha saída: vão dizer que eu estou querendo acabar com o partido, sou leiga nas questões teóricas e não sei nada sobre centralismo democrático, sou carreirista ou estou defendendo pessoas que gosto, estou sendo raivosa porque entrei no Minervino, não conheço a história do partido e mais um monte de adjetivos. Agora que já adiantei as atribuições, vão dizer que jamais fariam isso e que eu estou causando discórdia interna. E claro, não dirão isso abertamente, mas individualmente para pessoas que podem não contestar ou para a direção nacional.

É assim com Karen, com V, foi assim com N e C, etc. O cúmulo de tudo foi a tentativa de atribuir todas as críticas que já foram feitas a algum tipo de orientação de Ana Karen, como se as pessoas não fossem capazes de formular seus próprios pensamentos e colocando um alvo que pudesse ser responsabilizado por todos os problemas de unidade interna que existem.

Ao Comitê Central dirijo algumas questões, em relação ao CR Bahia, sei que já estão cansados de saber. Entretanto, porque não é feita nenhuma consulta, averiguação ou tomada alguma atitude diante de tantas denúncias? Os problemas da Bahia fazem parte das pautas dos plenos? A CPN têm assumido quais posturas? Tal nebulosidade não ajuda a resolver as questões. Ao contrário, temos poucos repasses de a que lugar nossos problemas relatados foram destinados, e um cansaço generalizado das pessoas que têm que todas as vezes buscar alguma assistência para mediar várias situações.

Confesso que lutei muito para permanecer minha militância nas fileiras, e vejo que em momentos mais tranquilos da minha vida consegui manter meu vigor nas disputas, mesmo porque até mesmo quando afastada, nunca parei de tocar tarefas e nunca fui de negar a construção real dos movimentos. Entretanto, vejo que os desgastes internos atrapalham minha dedicação às tarefas, me sobrecarregam e me pressionam psicologicamente a ponto de impossibilitar minha permanência. Dediquei 8 anos ao PCB e coletivos, e os últimos 3 foram os mais desgastantes e adoecedores.

Não vou entrar nisso mas deixo sublinhado o quanto isso reflete também as dificuldades de pessoas desempregadas, pretas e mulheres das fileiras da organização, que se frustram ao ver sua dedicação militante em tocar tarefas, e ver os saldos políticos se esbarrarem na condução problemática da direção, tendo que empenhar o dobro da energia para lidar com os problemas internos além das tarefas políticas e de organização e trabalho de base que tocam.

As questões mais recentes que trago são 1) a utilização das eleições para consolidar a direção do CR através da construção de figuras públicas e referência externa a certos militantes e 2) a tentativa de impedir a organização estadual do CNMO através da invalidação da etapa estadual da Conferência Nacional do Coletivo.

O Partido centraliza o debate eleitoral e suas decisões, mesmo assim, caso seja avaliado pertinente, as direções intermediárias acionam os mecanismos de discussão coletivas como Ativos Eleitorais, fora a construção coletiva de programa, contribuição dos coletivos, e o que mais for viável e de acordo com nossa forma organizativa. Na Bahia, há inúmeros incômodos com a forma que o CR conduz o processo. Primeiro que tivemos um Ativo Eleitoral a partir da cobrança da base, um espaço virtual após as pré-candidaturas serem lançadas sem comunicado interno, onde pouco se encaminhou. Cabe dizer que os informes acerca dos nomes escolhidos não existiram, causando desconforto na militância ao saber de muitas indicações pelas redes sociais.

Vendo que boa parte da militância não se sentia convencida, o CR passou a exigir empenho na campanha, emitindo uma circular que orientava número de compartilhamentos e aconselhava a não realização de atividades fora da tarefa eleitoral. Buscando centralizar a militância à tarefa prioritária. Eu imagino que o convencimento seria muito mais eficaz se tivéssemos garantido espaços de discussão — não se pôde, por exemplo, questionar as decisões do CR, nem se viu esforço em explicar o porquê delas.

Alegando a mesma circular, o CR fingiu não saber da realização da etapa estadual da conferência do CNMO para — após muito esforço, acontecer — alegar que a etapa não será validada por ter acontecido durante o período eleitoral. Aqui faço um resgate: após a desarticulação da direção estadual do coletivo, o CR indicou a assistência de PP (membro do CR) para auxiliar na organização do coletivo, porém, o militante pouco auxiliou, mesmo considerando as condições pessoais do PP, sabemos que houve uma indisposição do CR em ajudar a organizar a Conferência, visto que desde julho a secretaria de organização do CR estava ciente da tarefa e dos prazos.

Diante da proximidade do prazo para a realização da etapa estadual, as secretarias políticas dos núcleos do Minervino, em diálogo com a nacional e informando ao CR, organiza local, data, programação e finanças da etapa estadual e eu mesma fui responsável por informar os encaminhamentos ao CR — busquei a secretaria política no dia 17 de agosto, sem resposta, e no dia 29, após conseguir resposta da secretaria de organização, repassei. Além disso, em diálogo com outro militante do coletivo, o próprio assistente do CR pôde ver a programação, e até elogiou, mas não apresentou nenhuma alteração ou impedimento a ser feito.

Cabe dizer também que até mesmo a “invalidação” da etapa primeiramente chegou pelos métodos individualizantes que o CR costuma aderir, quando um membro do CR ligou para um dos militantes do coletivo (que nem tinha participado da etapa) questionando e colocando que a etapa não teria validade e dizendo que o CR não sabia da realização da mesma; e via comentário no grupo de um dos núcleos feito por JC, que é militante do PCB e do CNMO e está tocando tarefas eleitorais, sob a mesma justificativa. O CR orientou suspender todas as atividades da comissão estadual até se reunir com a nacional do coletivo.

A que interessa o CR invalidar um trabalho político que foi avaliado pela militância como exitoso e importante para a consolidação do coletivo no estado? O CR alega que o CNMO pouco está contribuindo com a tarefa eleitoral, como se não considerássemos ou estivéssemos colocando dificuldades, entretanto, foi inclusive a partir da realização da etapa estadual que o coletivo pode se organizar para propor encaminhamentos em relação à tarefa.

Além disso, pudemos perceber que mesmo com todas as dificuldades, o Minervino conseguiu crescer na capital e no interior do estado, e a etapa serviu para que houvesse um salto organizativo e político da nossa atuação. O que é muito importante pro PCB também.

A prática de quebra de centralismo, formação de tendência e perseguição é notada no Bahia há algum tempo, o que me cabe falar é sobre o que pude acompanhar quando estava na UJC — quando no último Congresso a CN chamou a atenção da então CE no período sobre alguns militantes defendendo teses em bloco, dentre eles A, hoje direção da UJC Bahia e do CR. Aqui cabe uma autocrítica coletiva, de não termos conseguido acompanhar mais de perto as articulações que o militante fez quando foi destacado para cumprir tarefas de direção pelo PCB.

Inclusive quero registrar que ele entrou na CE e na secretaria política da UJC BA por imposição do CR, em mais um desses episódios de desgaste. Falo disso na carta que mencionei acima, que foi respondida pelo CR com questionamentos a serem respondidos por mim, numa espécie de cobrança de provas por eu ter chamado o CR de autoritário, mesmo eu relatando esse caso.

Da mesma forma, sei que a entrada de D. na UJC foi problemática, então o mesmo entrou no partido e logo estava no CR, como “pupilo” de MP. E hoje está na secretaria política do PCB Bahia e no Comitê Central, cumprindo tarefas públicas fundamentais, enquanto cerceia o debate interno.

Camaradas, para que haja unidade e coesão interna, é necessário que haja uma confiança política entre os militantes da organização, e não é de hoje que eu não confio nessas pessoas citadas acima.

Por fim, gostaria de reiterar que EU NÃO AUTORIZO a divulgação desta carta para fora das instâncias do PCB e coletivos. Pois não estou aqui para ser responsabilizada por nenhum tipo de cisão, mesmo assim, estou aberta para conversar com qualquer instância, e aconselho às direções a solicitar o acesso às cartas e demais documentos que envolvem o CR Bahia, que já foram escritos por outros militantes, inclusive do próprio CR, rebatendo denúncias ou acusando algo ou alguém.

Além disso, é dever do CC e retomar o debate acerca da importância das tribunas permanentes, prezando os princípios do centralismo democrático. A militância tem o direito de saber as posições e as opiniões de quem disputa a linha política e organizativa deste Partido. E posso entender as precauções diante de uma história tão complexa e de tentativas de liquidação do PCB ao longo dela, mas isso não pode ser justificativa para limitar o conhecimento dos militantes das posições por trás de atitudes das direções, que por vezes ignoram as resoluções, o Estatuto e o centralismo democrático para exercerem aquilo que suas cabeças pensam — e aí sim, calçando um caminho de crises e cisões internas.

15 de junho de 2023

Comecei a escrever a primeira parte dessa carta há 9 meses, porém a deixei guardada, porque desisti do desligamento. Não foi o primeiro e nem o último quase, e dessa vez o que me fez ficar foi o Minervino. Depois, tinha dado esse documento como perdido, e senti falta dele, mas estava prestes a começar do zero diante de novos desgastes, mais tempo dedicado e a mesma morosidade em resolvermos os problemas.

De janeiro pra cá percebi que aquele cansaço que uma hora chega pra todes, estava chegando para a militância mais nova, que mais uma vez se embaraçava entre seus problemas com o estudar, trabalhar, militar, morar só e outras questões individuais que tornam tudo isso mais complexo. Além de tudo isso, novas polêmicas internas surgiam em espaços e instâncias diferentes.

Há 9 anos estou no Partido, comecei pelo CFCAM, estive maior parte da militância na UJC, em 2020 entrei para o PCB e faz pouco mais de um ano que estou no CNMO. Nessa organização, pude aprender tanto que nem sei dimensionar o quanto. Uma das coisas que me marcam é a própria história do PCB e entender qual o momento da história desse partido eu estou; assim aprendi a respeitar e admirar fortemente a reconstrução revolucionária do Partidão, sabendo que sou contemporânea de vários militantes que dedicaram suas vidas a esta tarefa.

Outra coisa que aprendi aqui, foi que essa dedicação de vida não é um apego aos nossos símbolos (apesar de saber que são importantes!), muito menos aos nossos camaradas (apesar de saber que são imprescíndiveis!), mas justamente, a convicção da necessidade de uma organização comunista para a ruptura com esse modo de produção do trabalho e da vida. Não era pelo Partido, mas pela Revolução. E justamente por isso estar em primeira (e não última!) instância, é que defender o Partido é necessário.

Portanto, não esperem de mim uma visão romântica e fetichista desse processo e muito menos das pessoas envolvidas. Doar a vida ao Partido é doloroso também. Pessoas assertivas num momento, erram também. Quadros que essas pessoas trazem e formam, amadurecem também. É o próprio Tempo, e não há nada mais filha desse processo de 30 anos de reconstrução, do que as disputas que hoje existem no Partido.

Nós queríamos um Partido forte e grande, a UJC fez isso. Nós queríamos um Partido autocrítico sobre o trabalho entre as mulheres, o CFCAM fez isso. Nós precisamos formular sobre gênero e sexualidade no capitalismo, o LGBT Comunista tem feito isso. Nós precisamos de um giro tático para avançarmos na disputa do movimento negro, o CNMO vêm fazendo. A Unidade Classista tem respeito dentro do movimento sindical, ocupações, e é força dirigente em várias categorias. Nunca vi nós atuarmos sem que saibam que nós somos o PCB. Quem defende que os coletivos são o mal do Partido, parece temer o trabalho político e a popularização do PCB.

Parece que a direção do PCB teme desmedidamente uma possível cisão. E parte dos seus militantes acusam os coletivos da geração dessa sensação. O que é pior? Essa posição não é clara!

Eu digo que a causa dessa sensação é que a busca por sairmos do trabalho artesanal para um trabalho consequente e que não se limite aos círculos da pequena burguesia urbana e intelectual tem trazido desconforto. Faz sentido temer o aprimoramento da nossa forma organizativa a partir da realidade brasileira atual? Nós sabemos que o CC elabora sobre isso, mas o que estamos dizendo é que não estão dando conta! E não é necessariamente pelas pessoas que lá estão (apesar de que, convenhamos, boa parte do CC está literalmente agindo pela própria cabeça!), ou por incapacidade, mas sim, pela forma extremamente burocrática ou auto proclamatória pelas quais essas elaborações são feitas.

Digo aqui algumas: comunicação entre CC/CR e base é falha, desconfiança e formação de tendência a começar pela própria direção — por exemplo, a turma de MP no CR da Bahia, estrelismo e pequena política, perseguição a quadros específicos — por exemplo, a carta de P.P sobre Karen, à atribuição de críticas coletivas a G. na CE da UJC para tirá-lo da tarefa de secretário político. Enfim, coisas que estão nas mãos de quem dirige o partido, e não são coletivizadas, ficam à mercê da vontade política dos seus membros a resolução ou não, o método de resolver, e enfim, vão morrendo na praia.

Diante das últimas discussões sobre a postura do CC no debate sobre imperialismo e conjuntura internacional (que só se tornaram públicas até mesmo para a base, após a publicação de um texto-denúncia em um canal externo ao PCB), me veio um novo estalo e pensei: porra, mais uma vez sendo feita de besta. Porque me dei conta de que escamotear o debate interno através de uma comunicação pífia e da falta de espaços de discussões amplas (falando nisso, se preparem e aproveitem a Conferência Nacional de 2023) vai muito a calhar para quem quer esconder suas posições divergentes sobre a conjuntura, tática e até estratégia, mas continuar agindo com base nelas — e não na síntese coletiva. Porque o que pude ver (até porque sei que não posso ver tudo) é que parte do CC não está respeitando o próprio Congresso que o elegeu.

E é muito estranho isso porque pelos repasses que ouvi houveram acordos no Congresso para tentar amenizar as disputas internas. Quem não foi à etapa nacional provavelmente não sabe disso. Mas cabe perguntar, valeu a pena?

O que avançamos em termos de estratégia? Quanto ganhamos em termos de segurança interna, influência nos movimentos populares, crescimento orgânico? O trabalho feito nas bases parece rivalizar com a condução do Partido. Às vezes parecem duas coisas diferentes. E imagino o CC olhando amedrontado com os quadros sendo formados nos coletivos através dos trabalhos de base.

A sensação de cisma que a direção tem, pra mim aparece como sensação de reacionarismo, de guinada à direita, de desprezo pela Estratégia Socialista. Por outro lado, a síndrome de “salvador(a)” do partido, que alguns oportunistas surfam na onda, não ajuda a resolver nada. Focar em disputa interna e autoconstrução não basta, forçar um debate público constrangedor muito menos — quando a própria base do complexo partidário se surpreende com tanta coisa jogada no ventilador, e os urubus se deliciam com nossa fragilidade exposta.

A gente quer se resolver ou continuar brigando? Eu quero saber a quais rumos estão levando o Partido, e vejo que no geral a militância não está conseguindo acompanhar as bases teóricas que formam as divergências, e como disse Brecht… “não se envergonhe de perguntar, camarada! […] veja com os seus próprios olhos!”.

E não, eu não vou continuar lutando enquanto todas as cartas não estiverem na mesa, pois dedico minha vida ao socialismo, e não ao Partido. E não vou ser cega em tiroteio, não vou ser militante por amor, eu não estou convencida de que essa disputa velada nos levará a algo melhor, pelo contrário, vejo cada vez mais perto a vitória daqueles que querem implodir o PCB.

Digo que “na ânsia de defender acaba afogando”, e é muito do que vejo principalmente daqueles que amam falar sobre identitarismo, mas não agem para que o PCB saia de dentro dos seus próprios problemas, sob o mantra de que o Partido não erra, como se ele não fossemos nós e o nosso ego, nossa descrença no novo, nosso medo da renovação de quadros, nosso racismo e misoginia envergonhados, nossa acomodação em nossos seminários e cursos, nosso elitismo disfarçado de intelectualidade. Mas também sei que ele é nossa camaradagem, nosso estudo coletivo, nossa humildade em chegar para aprender com um outro movimento, nossa juventude e nosso vigor, nossa disposição e trabalho, e vocês não podem impedir isso. Temos muito trabalho pela frente, chega de atrasa lado.

Eu continuei no Partido porque entendia que era mais acertado debater tática numa organização que já tem uma estratégia revolucionária sólida, mas temo que nossa estratégia, a grande vitória dessa reorganização, esteja se diluindo pelas mãos de quem ajudou a formulá-la.

O que mantém minha convicção ideológica é militar no Minervino, que apesar de sofrer de todo tipo de racismo dentro do complexo partidário, não se deixa levar pelo revanche, nem permite ser usado como chaveiro. No Minervino enxergo potenciais fortes, trabalhos que dão orgulho de ser organizada, firmeza em ser comunista. Quase fui e voltei porque sei que nas diversas instâncias, temos muitos bons exemplos. Vai ser difícil me ver fora do Partido, mas não quero sair esgotada, sem energia pra lutar, como vejo vários e várias saindo, com saúde debilitada e consciência abatida. Gostaria de dizer que não pretendo entrar em nenhuma outra organização no momento, e sei da importância de não me desvincular do movimento geral dos comunistas brasileiros e do mundo, mas continuarei fazendo os trabalhos de base localmente, como sempre fiz, porque no final, sem isso, nada importa.

17 de julho de 2023

Enviei a Carta acima para dirigentes do CNMO para iniciar o processo do desligamento. Nas conversas posteriores propuseram minha permanência para ficar e auxiliar na consolidação da CE do CNMO. Achei justo e avaliei. Coloquei como “prazo” o pleno do Comitê Central que eu sabia que iria acontecer nos primeiro fins de semana de julho.

Sabia que nesse pleno os últimos acontecimentos seriam debatidos e quem sabe, rolaria alguma movimentação. Como pensei, a discussão e os encaminhamentos aconteceram. E também caminhamos, temos, finalmente uma Coordenação Estadual do Minervino Bahia, porque o corre não para.

A exposição do camarada Jones da perseguição sofrida dentro do Partido mostra que o modus operandi que relatei do CR Bahia, é executado pelo próprio Comitê Central. Tenho respirado fundo por ver que não estamos sozinhos e que sim, os problemas relatados por nós também não são aceitos pela base desse complexo, vide a polêmica aberta e os relatos de muitos militantes. Mas também respiro ofegante com repúdio à postura do CC ao enviar uma circular que pretende dar um cala-boca na base, jogar sal na ferida e censurar os coletivos.

Não entrarei na polêmica em si e muitos menos me deixarei levar pela emoção. Calma, respira.

Èsú movimenta e comunica e eu estive confiante em Tempo, quando muitas vezes deixei de falar e olhei em volta. Tempo vira e cai a folha e eu sei que Èsú organiza no caos, quando muitas vezes falei e pedi força para agir pelo justo.

Agora, acredito que é tempo da ofensiva popular. Na Conferência do CNMO ouvi uma camarada dizer “o ideal é termos um partido comunista tão negro que não precise de um coletivo”. Isso ecoa em minha cabeça até hoje, é óbvio, nós estamos no Brasil e os superexplorados também aprendem a ler! Enquanto não efetivarmos um giro-tático popular não vamos conseguir defender a estratégia socialista no Partido, e perderemos nosso processo de reconstrução revolucionária se a direção continuar agindo como mandatários da organização.

Em minha base de atuação defenderei:

1- ABERTURA IMEDIATA DA TRIBUNA DE DEBATES DA CONFERÊNCIA DE 2023;

2- DESTITUIÇÃO DO ATUAL COMITÊ CENTRAL E ELEIÇÃO DE NOVA DIREÇÃO (PRÓ-TEMPORE) NA CONFERÊNCIA DE 2023;

3- ORGANIZAÇÃO DO CONGRESSO DO PCB PARA 2024 — DISCUSSÃO DO ESTATUTO, RESOLUÇÕES E ELEIÇÃO DE NOVO COMITÊ CENTRAL.

Fora disso, não haverá clima, meios, formas e nem pessoas capazes de evitar o colapso do Partido Comunista Brasileiro.

19 de julho de 2023

Se o CC já tivesse sinalizado que — pelo menos — abrirá a Tribuna de Debates, eu não precisaria expor essa carta. Até ontem a divulguei internamente, mas sem esperança de alguma resposta da direção.

Não confio na condução da Conferência/Congresso pelas mãos do atual CC, nenhuma ala parece legitimada pelas bases e os dissensos sobre a polêmica atual não permitirá confiança política, mesmo numa direção temporária.

O Partido somos nós, jovem, com vigor, revolucionário, vivo!

Por incrível que pareça — e para desapontar os especuladores — tem muita gente do PCB aliviada por essa movimentação, apesar de todas as válidas ressalvas com o método.

Camaradas, boa luta pra vocês, sinto muito mas estou desistindo.

20 de julho de 2023

1) Respeito profundamente os e as camaradas que travam a disputa internamente e rejeitam a exposição pública.

2) Divulgo esta carta de desligamento porém não quero ser exemplo pra ninguém. A verdade é que estou cansada. mas não saiam, camaradas, respirem e se apeguem ao trabalho que vocês fazem, o PCB são vocês.

3) Divulguei até o dia 18 esta carta internamente com o título (era pra ser um…) DESLIGAMENTO, e só agora resolvi reformular para um desligamento definitivo e divulgar publicamente.

4) Invés do CR estar defendendo abrir o debate interno diante de uma crise exposta, estão verificando quem curtiu os tweets de Jones para abrir medida disciplinar, com membro do CR e CC disseminando em sua célula uma política de terror e teorias conspiratórias.

5) Não simpatizo com a forma que o Jones têm exposto os problemas, tem muita gente na base que está sendo convencida pelo CC justamente porque também não concordam com isso. Mas admiro a coragem do camarada em fazer o que está fazendo e presto aqui minha solidariedade. Fico pensando se fosse eu quem estivesse sendo perseguida e tivesse que expor tudo para me defender de mentiras, com certeza já teria cometido erros nesse processo, e por ser “só” uma militante de base, estaria sendo taxada como a louca fracionista.

6) Tenho muitos problemas com a galera mais nova do CC que está sendo perseguida, mas ninguém aqui é boba e geral sabe que o buraco é mais embaixo. Os erros de vocês também prejudicaram os coletivos. Apostar nos acordos internos, nas posturas salvacionistas e personalistas também nos atrapalhou até aqui. Vocês tinham que ter a humildade de ver que também tem muita gente nessa disputa interna. Nossas mãos estão sujas de barro e sangue.

7) Estou à disposição do Minervino e confio em vocês. Sei quem está dias sem dormir mediando e articulando a base que está sofrendo com isso e sei como está sendo doloroso. Sei que tem muita gente no PCB que procura e encontrará a mediação adequada. E vocês aqui no twitter, segurem a onda, sei que estão sedentos pelo debate interno, mas vamos ver direitinho o que estamos pautando. Sem ingenuidade. Lugar de pautar é na célula, nos núcleos, vocês não vão convencer ninguém no Twitter.

8) Eu queria receber um informe do tipo “camaradas, o partido abriu um espaço de debate desde as células; ou, vamos abrir a tribuna de debates e todas as considerações aqui feitas podem voltar a ser internas”. Aí não teria nenhuma postura fracionista que pudesse ficar escondida sob véus.

9) Tudo isso — apesar de você estarem lendo — não é para vocês, abutres. Vão cuidar dos problemas internos das organizações de vocês, e muito menos é para os que fazem o papel de choquei de grupos de pesquisa. Os especuladores acham que sabem de tudo, mas não podem ver 1/3 do que somos e estamos passando de verdade.

10) Dispenso curiosos e solidariedade de boca.

24 de julho de 2023

Esta carta, que se transforma cada dia mais em um diário, cresce à medida que repenso as coisas. Partes dela já rodou entre alguns camaradas, mas mais uma vez recuei em divulgá-la. Vejo que a postura de muitos é a mesma: recuar. Durante o fim de semana, me distanciei desse assunto e desde então não li, não assisti nada e não quis telefonar pra ninguém.

Um dos motivos para o meu recuo foi ter conversado com Natália. Quis esperar a síntese de outros camaradas. Mas, camaradas, aquilo que escrevi no dia 17 ainda mantenho como convicção. Como avaliar qualquer coisa sem algum espaço interno de debates? Ou vocês acham que é possível ter uma conclusão das coisas a partir de ligações (clandestinas, diga-se de passagem) e reunião de células, isoladamente?

Não tenho achado nada justo.

Não abri para ler mas vi que Iasi enviou uma carta que desceu como circular para todo o Brasil, questionei meu assistente: então minha carta também pode ser enviada? Ele respondeu: recebemos o material da lista do CC para os CRs.

No ponto 5 e no ponto 6 do que escrevi dia 20 (que era para ser postado na internet) eu deixo bem claro a minha posição quanto aos métodos e até sobre as pessoas envolvidas: não estou convencida de que vocês tem a melhor tática para lidar com essa crise no PCB.

Na carta inteira deixo explícito: não confio e não vou defender a direção do PCB regional e nacional diante de tantas denúncias parecidas às minhas.

Quero dizer que: mesmo que Jones e cia não tivessem feito nada pelo Minervino, o que foi que MP, D e cia fizeram?

Quero perguntar o que nós fizemos quando quadros negros e negras, mulheres, LGBT+ foram minados nesta organização, violentados a ponto de muitos terem que passar anos para se reconstruírem emocionalmente e tocarem suas vidas?

O que nós fizemos quando J foi expulso? Quando P e N foram desgastados até renunciarem à tarefa no CR Bahia? O que fizemos quando G. foi acusado de incapaz quando era um dos melhores quadros da juventude na Bahia e no Brasil, e foi escanteado pelo CR Bahia, a fim de garantir sua hegemonia política no estado? O que fazer quando um núcleo inteiro do Minervino é desorganizado por conta de críticas ao Partido e às questões raciais no complexo?

Camaradas, eu sempre tive esperança de chegar o momento de nós cobrarmos todas as injustiças, e vocês sabem que não falo de ouvir “desculpa, falhei”, mas de dizermos “não toleraremos nossas falhas”. E eu acredito, de forma honesta, que existe pouca reação porque não queremos abrir mão desse Partido e da sua importância. Mas repito, camaradas, que na “ânsia de defender, acaba afogando”, e não consigo ver mais um preto ser alvo nesse partido, sem que haja sequer bom senso de prezar pelo amplo debate, pela conversa franca e olho no olho.

Mais um vez: a gente vai se basear em ligações e opiniões pessoais?

Eu não acredito que um racha, uma convocação de congresso extraordinário é a melhor coisa a acontecer. Talvez só o tempo dirá. Queria que uma turma baixasse a bola real, pois tem muita gente no off se acabando pra tirar alguma vitória dessa disputa. Mas com certeza não acredito na pureza do CC e não vou defender o partido sob essas condições. São 101 anos de história, e nós temos, até aqui, as melhores condições, pessoas e linha política para sermos o Partido do povo, aquele que estará na linha de frente da revolução brasileira.

Mas, não podemos esquecer que a história se faz pelas nossas ações. Mesmo saindo, não pararei meu trabalho, e respeito quem diz que não largará o partido pois não largará o trabalho feito e o planejado. Mas do lado de cá, sempre fomos nós, pouco o Partido chegou junto para nos organizar, muito pelo contrário, aliás. Então me afastarei de toda essa neblina, e espero enxergar elementos que não consigo agora. Espero que eu esteja errada, e que vocês consigam fortalecer o Partido a partir desses embates, e espero que o Minervino não seja usado como amortecedor das disputas, e mais, que consiga dar a direção que esse Partido precisa, aí com certeza verei nossa vitória em ver vários voltando para este lugar.

Eu poderia me colocar nessa tarefa junto com vocês, mas diante de tantas questões, vejo que será melhor me afastar para ampliar a visão. Aprender com outros espaços, descansar, cuidar da vida. Dentro, com os motivos que tenho hoje, mais atrapalharia do que ajudaria, e teria que abrir mão da minha saúde para continuar; e diferentemente da poesia… não tem valido a pena.

28 de julho de 2023

A carta de Natália e Cervan certamente é uma das contribuições mais valiosas diante dessa fase de tempestades que estamos passando. Eu gostaria de, com todo o respeito, fazer algumas considerações sobre ela. Li e reli a carta e admiro muito a lucidez dos camaradas, entretanto, não estou convencida de que os erros de Jones anulem todos os problemas relatados por ele. Não temos nada a dizer sobre as denúncias da medida disciplinar? Nem sobre a lógica de “dois pesos, duas medidas” na expulsão do camarada do CC e a mera autocrítica solicitada a Eduardo Serra? Sendo que o primeiro foi expulso por criticar publicamente um erro do segundo?

Tudo bem que Jones pode não ter “ batido um prego num sabão” pelo Minervino, mas o que será que os demais fizeram, a gente sabe o trampo que L. faz como assistente, e outros camaradas também, mas e SM, MP, D, ES, EC, MI, CB, etc etc etc? Temo que a gente embarque num “personalismo negativo” ao avançar nas críticas ao carteiro e não debater o conteúdo da mensagem. Temo também que ao nos defender para não sermos usados em um projeto de “racha personalista” por uns, a gente seja usado por outros.

Mais uma vez fico lamentando o fato de não termos ainda aberto às Tribunas, pois um baita texto como esse, que apresenta que o buraco é mais embaixo e que tem muito mais gente nessa disputa seria muito enriquecedor, pois o que vimos da repercussão dele até aqui foi uma certa deturpação do que foi dito, como se fosse meramente um ataque pessoal, quando nitidamente se apresentou a possibilidade de uma “outra via” para essa crise, com proposições ricas sobre vida interna, finanças e combate às opressões, das quais eu tenho muito acordo.

Eu estou exausta de conversas de canto, de gente ficando indignada com o que saí na internet e procurando um espaço entre os seus para dialogar, sentindo-se clandestinos por abrir conversas paralelas sobre algo que até então está coibido de ser debatido. Acho insuportável esse climinha tosco de citações recortadas de Lênin e um eterno “é você”, “você que é” protagonizado pelos nossos dirigentes no Twitter.

Existe um debate bem profundo sendo alçado, principalmente pelos “acadêmicos” do CC, que é a influência dos partidos comunistas e da conjuntura internacional nessa nossa crise. Aqui temos uma questão extremamente relevante de resolver, porque de um lado há uma clara “política de terror” em acusações que para mim, até então, não passam de especulações infladas; e de outro, uma janela aberta para debatermos e compreendermos quais alianças temos que construir em nosso princípio de internacionalismo proletário. Afinal, acusar um partido de um campo aliado custa caro, e eu e toda a militância necessitamos de provas, como Nat e Cervan citaram, “em qual mentira vou acreditar?”.

Acho que é aqui um dos pontos que devemos focar nossa dispô. Além disso, toda essa polêmica acaba por expor que sim, nós — pessoas racializadas, pobres, mulheres, LGBT+, também nos organizamos para disputar o partido, e temos muitas outros pontos para criticar, propor e superar dentro do Partido Comunista Brasileiro.

Aqui finalizo esta “carta”, que se tornou uma espécie de diário. Deixo claro que depois de muitas avaliações e reavaliações eu NÃO ESTOU ME DESLIGANDO DO PCB OU DO CNMO, sim, vou ficar. Mas quem sabe se depois dessa eu continuarei aqui…