Biblioteca:Partido Comunista Brasileiro/O Partido somos nós

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O Partido somos nós
Escrito porLorena Martins, Ivie Mendonça e Ruggeron Caetano (militantes do PCB e do Coletivo Negro Minervino de Oliveira)
Publicado 1ª vez2023
FonteTexto no Medium

Com a emergência do texto veiculado pelos camaradas Natália Silva e Thiago Cervan, os quais nutrimos profundo respeito apesar de severas discordâncias, optamos seguir pelo mesmo caminho de publicizar nossa posição, prezando pelo debate franco. Em um primeiro momento, é importante destacar que os camaradas trazem premissas corretas quanto às fraquezas internas do complexo partidário, sobretudo no que diz respeito à questão racial, mas também quando abordam nossos problemas organizativos, nossa ineficaz política de finanças e de recrutamentos. Iniciar o texto com essas premissas foi sagaz, tendo em vista que partiram de consensos na militância. Nossa intenção, assim como a de muitos militantes que decidiram cerrar fileiras no PCB e seus coletivos, é justamente lutar pela consolidação e avanço da nossa linha política. Vale dizer que não passou despercebido o recurso discursivo que apela para o abalo emocional quando citam o triste episódio da morte de uma criança de 4 anos, meramente para sensibilizar o leitor acerca dos argumentos que sucederam essa passagem.

Reiteramos que tanto a existência do presente texto quanto do texto dos camaradas, é reflexo da ausência de efetivação dos espaços de debate interno dos organismos partidários. A utilização deste espaço para a realização do debate demonstra que estes também compreendem as debilidades dos nossos canais de informação, uma vez que estes só funcionam efetivamente para aqueles que têm o crivo do Comitê Central. Tomemos como exemplo o pronunciamento de Mauro Iasi realizado em 21 de julho de 2023, mesmo sem a abertura de tribunas e boletins. Ora, sejamos honestos, a distribuição da carta de Mauro Iasi deixou claro que existe estrutura de comunicação interna, o problema é a seletividade do que deve ser comunicado ou não. Há um claro afastamento entre a direção e as bases que nos trazem até o presente momento. O partido não nasce pronto, está em constante transformação, afetando e sendo afetado pelas contradições que enfrentamos. O Partido está também em constante disputa, e é exatamente o que estamos fazendo: buscando vitórias apesar das dificuldades que se apresentam nas diferenças de concepção de organização revolucionária.

O Coletivo Negro Minervino de Oliveira (CNMO) é um importante organismo do Partido Comunista Brasileiro, mas internamente sua valorização é questionável. Ao invés de acertadamente sermos vistos como um valoroso “braço” do PCB, o CNMO é visto como muleta. Perguntamos a vocês, camaradas leitores que integram coletivos e o Partido, quantas tarefas não relacionadas à raça, gênero, orientação sexual e identidade de gênero vocês têm sido convidados a compor ou estejam tocando em seus organismos? Ainda que o trabalho político do CNMO seja acertadamente resultado de uma construção que busque superar os problemas internos existentes, o trabalho consolidado de muitos e muitas de nós não é o suficiente para comportar a discrepância do peso político na hora das disputas internas no complexo partidário, com é destacado pelos próprios camaradas ao dizer que as nossas condições de lutas não são iguais para todos os militantes.

Os militantes do coletivo negro sabem que existe clara dificuldade de escoar nossa produção, formulação e agenda de atividades para a totalidade do complexo partidário. No CNMO-RJ, temos camaradas que são especialistas em segurança pública e não foram sequer consultados no momento da produção do programa de governo de Eduardo Serra que, diga-se de passagem, restou deplorável no que tange à segurança pública e à política criminal. Fato é que mandaram para a base discutir o texto pronto e nossas sugestões de alteração praticamente não foram absorvidas, sem qualquer justificativa.

Buscando combater inverdades em nossas fileiras e verdadeiras tentativas de rompimento de trabalhos que vêm sendo construídos de norte à sul, levantando a bandeira da democracia revolucionária, não nos furtamos do debate público compreendendo a falsa correlação que tem se estabelecido entre a liberdade de crítica e a unidade de ação que nos são tão valorosas enquanto marxistas-leninistas. O processo que se dá atualmente no seio do Partido surge na necessidade de avanços na Reconstrução Revolucionária do PCB, no esforço de garantir que o giro operário-popular e a linha revolucionária na conjuntura brasileira se efetivem, processo fundamental para a emergência de um novo perfil de militantes. Trabalho este que os coletivos partidários têm se destacado na realização.

Os camaradas autores do texto “seu jogo é sujo e eu não me encaixo” apontam os problemas e se perdem ao não identificarem as raízes das questões apontadas, tristemente tratam a crise partidária de maneira maniqueísta e depois, tentam convencer internamente a militância de que foi uma posição de mediação. Ora, não subestimem suas próprias bases, camaradas. Dizem, “é importante que fique claro, hoje o que existe em nosso partido são dois grupos: os que são a favor do racha e os que são contra. Fazemos, sem ressalvas, parte do segundo grupo”. Os camaradas, no início do texto, prometem atacar os problemas organizativos e, de repente, alteram o tom para ataques pessoais aos camaradas que consideram os agentes do pretenso racha.

Vejam bem, camaradas. De onde parte o argumento de que há um grupo orientando um racha no partido? De que existe um grupo querendo destruir os trabalhos positivos de nossa militância? É importante a responsabilidade de apresentar fatos e não conjecturas descabidas em um texto público, caso contrário, a aparência é de que trazem fofocas de corredor e não contribuições para o debate real. Gostaríamos de saber se os camaradas concordam com a alienação dos coletivos e juventude acerca do debate que precisa ser travado em todo complexo partidário. Os coletivos efetivamente não atuam como mero potencializador das intervenções e acúmulos do PCB nas lutas sociais, enquanto militantes e intelectuais orgânicos formulamos e avançamos prática e teoricamente a linha do Partido Comunista Brasileiro. Não é justo que nos seja relegado o papel de “simpatizante” ou “amigos” do Partido quando conveniente, se cotidianamente o partido somos nós! Natália e Cervan, ao final do texto, dizem que são o partido comunista. São mesmo, militantes recrutados pelo PCB, mas ao desconsiderarem a circular grotesca que silenciou o debate nos coletivos e nos relegou a meros simpatizantes e expectadores que deveriam aguardar a resolução da crise de boca calada, desconsideram o clamor das bases por participação, respeito e reconhecimento. A UJC, o LGBT Comunista, o CFCAM, o Vianinha, a UC e o CNMO são os responsáveis por termos o bloco do partido nas ruas, por tocar as tarefas cotidianas, o famigerado trabalho de base, levantamos a bandeira e disseminamos a linha política do Partido Comunista Brasileiro. Exigimos reconhecimento de que sim, o partido somos nós!

Quando Dalton nos diz que há beleza em ser comunista, apesar das dores de cabeça, camaradas, isso nos remete ao momento que estamos enfrentando em todo o complexo partidário. Nossas dores não diminuem no horizonte revolucionário que construímos cotidianamente, com vozes e mãos de todos os cantos do Brasil! Não buscamos a cisão do PCB ou reivindicamos construir um outro partido — O Partido somos nós, com todas as suas contradições, somos aqueles e aquelas que também não são reivindicados em outros momentos senão para lidar com questões de opressão. O Coletivo Negro Minervino de Oliveira não está sendo utilizado como escudo por camaradas x ou y, os coletivos vêm sendo silenciados pelo centralismo burocrático do Comitê Central.

Os camaradas mentem ao dizer que na Coordenação Nacional do CNMO só existem pessoas com trabalho de base consolidado, temos camaradas que têm construção real e de anos na educação popular, como o próprio Cervan, mas também temos camaradas em instância de direção que trabalham nos espaços burocráticos da organização com pouca inserção no trabalho de base. E isso não é essencialmente um problema, somos leninistas e compreendemos a luta ideológica como método revolucionário, não há espaço para basismos em nossa concepção. Mentem também ao induzirem a militância a pensar que Jones Manoel não tem “trabalho político”, desconsideram que o camarada constrói a organização desde 2013, construiu a UJC em Pernambuco ao lado de valorosos camaradas e, juntos, reconstruíram nosso trabalho na UFPE. O camarada é professor, trabalhou e segue trabalhando muito para levar nossa linha adiante. Chegam ao ponto de acusar Jones de ter defendido policial, só deixaram de dizer que se tratava de Áureo Cisneiros, militante do PSOL e presidente do sindicato dos policiais civis (SINPOL-PE) que foi demitido por perseguição antisindical pelo governo de Paulo Câmara (PSB). Jones apontou a perseguição ao policial. Como isso aparece no texto dos dirigentes do CNMO: “Dito isso, o que precisamos esclarecer, é que quem defendeu que o PCB saísse em defesa da polícia foi, justamente, Jones Manoel”. Os camaradas não podem utilizar artifícios da mídia burguesa para legitimar os argumentos. Pois vejam a posição de Jones Manoel à época da demissão: “Hoje, em Recife, tivemos um ato contra a demissão e perseguição ao líder sindical Áureo Cisneiros. Áureo é perseguido pelo Governo Paulo Câmara (PSB) e esse ato antissindical conta, até agora, com o silêncio ou timidez do PDT e PCdoB, parte do governo”. Existem, de fato, muitas controvérsias acerca do caráter de trabalhador de policiais civis e militares, esse tema ainda não foi esgotado por nossas discussões, mas esse tipo de argumento ad hominem que falseia a realidade não será absorvido pela militância bem formada e atenta do complexo partidário, Em suma, no início do texto dizem superficialmente quais são nossos problemas, atacam. corretamente, o afastamento entre dirigentes e base e, no fim, dizem estar ao lado da fração CC (Comitê Central). Sim, fração CC, porque se devemos admitir a existência de uma fração, então depreendemos que existem no mínimo duas frações.

Os camaradas citam a construção da conferência nacional do CNMO, ocorrida em novembro de 2022, como um enorme exemplo de organização coletiva dos trabalhos, um verdadeiro espantalho agora usado publicamente, sem expor a autocrítica que hipoteticamente foi realizada pelos camaradas autores daquele texto, fazendo parecer que esgotamos nossas diferenças e debilidades nesse processo. É preciso que se considere o esforço dos camaradas em realizar a tal conferência, foi um trabalho árduo para arrecadar finanças para a execução do encontro, mas as críticas posteriores consensuaram que se tratou de um evento atrapalhado, construído às pressas de maneira amadora e sem método organizativo claro, os grupos de discussão tiveram que pensar na hora sobre como discutir e destacar as pré-teses superficiais, que trataram de maneira pouco aprofundada diversos assuntos caros à população negra, não por incapacidade de formulação dos militantes, mas pela má organização do período pré-conferência. Os debates nos núcleos foram esvaziados e os destaques de Estados como Santa Catarina, Rio de Janeiro e do Distrito Federal foram perdidos pelos caminhos. Reconhecemos que o esforço dos camaradas é louvável, mas essa carteirada de bastião da construção coletiva é desmedida e desconsidera que sequer conseguimos discutir com competência temas como segurança pública, política de drogas e saúde do trabalhador. E o modo como o tema da Conferência Nacional foi tratado no texto dos camaradas, assim como no texto da nacional do LGBT Comunista, denota que as direções nacionais precisam ficar atentas à reprodução de práticas do Comitê Central do partido ao formar suas próprias conclusões e as expor, desconsiderando os processos de crítica e síntese no interior da organização. Aqui, não se recai em assembleismos, mas sim na verdadeira construção do centralismo democrático.

As debilidades sobretudo organizativas, mas também políticas, da supracitada conferência, poderiam ter sido evitadas ou ao menos reduzidas se o Comitê Central e a atual política partidária para os coletivos fosse levada com a seriedade que necessitamos. O partido possui experiência e conhecimento o suficiente para a organização do espaço, mas relega a construção do coletivo inteiramente para os seus integrantes, seja naquilo que tange à linha política relacionada à questão racial, seja a organização de espaços fundamentais como uma conferência nacional, não podemos contar sequer com a experiência e acúmulo de nossa própria organização!

As denúncias que estão sendo feitas ocorrem para que avancemos na construção da via revolucionária. Caso esses processos não estivessem ocorrendo, quantos de nós teriam conhecimento sobre as participações do Partido nos encontros da Plataforma Mundial Anti-imperialista? Não há qualquer informe nos canais de comunicação do PCB. A quem interessa esse silêncio? Recordemos Samora Machel ao destacar que a verdade deve prevalecer entre a nossa gente e que inverdades e/ou omissões são pontos centrais para fundamentar a calamidade do Partido. É válido frisar que as tribunas de debate deveriam ser perenes e, portanto, deveriam cumprir o papel de estar absorvendo todas essas disputas que estão sendo externalizadas. Mas por vontade do Comitê Central, estamos sem qualquer canal efetivo de debate interno.

O Internacionalismo é essencial para nossa prática revolucionária e não pode ser exercido conosco nos aliando àqueles que divergem da teoria leninista sobre imperialismo. Recobramos a declaração do Partido Comunista do México: Tal grupo de provocadores será registrado vergonhosamente por seu papel pró-imperialista, e a história julgará aqueles que decidirem não recuar e permanecer nas fileiras do PAM, legitimando seu papel provocador.

Acreditamos que não devemos temer ou rebaixar as históricas bandeiras que nos trouxeram até aqui, muito menos varrer para debaixo do tapete os problemas que ocorrem sem discuti-los coletivamente, uma vez que nossa responsabilidade também é coletivizada. Silenciar o debate internamente não fará com que ele não aconteça, tampouco acabará com os desvios que vêm sendo praticados em nossas fileiras.

É leviano, camaradas, no calor dos acontecimentos apontarmos que determinado posicionamento é legítimo nos fundamentando por argumentos de autoridade, num discurso que beira o tarefismo. A flagrante concepção basista dos camaradas se opõe diretamente à concepção marxista-leninista. Enquanto milhares de iniciativas surgem em diversos pontos do Brasil, não existe processo de unificação de uma política comum para todo Partido. O PCB é hoje um amontoado de círculos locais mais-ou-menos articulados artesanalmente sem uma política comum.

Camaradas, precisamos golpear juntos para estarmos à altura da tarefa revolucionária! Para que muitos pés estejam sujos de barro, temos inúmeros camaradas não vistos que se doam tanto quanto para as tarefas acontecerem. Caímos muitas vezes no moralismo político que os demais camaradas denunciam. Perdão, camaradas, ninguém toca tarefa sozinho e se o faz, é mais um sintoma da divisão revolucionária do trabalho artesanal que temos desenvolvido em todo o complexo partidário. E é justamente por isso que a concepção leninista de partido considera a luta ideológica como método. Nos posicionar de forma contrária aos desmandos do Comitê Central não nos torna militantes menos orgânicos, tampouco significa que não somos capazes de tomar partido dentro da política interna sem que algum tipo de manipulação ocorra, como muitos discursos têm dado a entender.

Duas coisas nos causam maior estranheza: 1) a afirmação de que há um grupo que deseja rachar o partido e, consequentemente, quebrar os trabalhos e 2) um posicionamento sem ressalvas ao lado do Comitê Central sob a justificativa de que esses não desejam o fim do partido.

Sobre agitação e propaganda, o Comitê Central tem se mostrado omisso no tocante à resolução 86 do XVI Congresso. Vejamos:

86. A propaganda e agitação em meios virtuais também precisa passar por um processo de profissionalização e centralização por parte do Partido e seus coletivos, a exemplo do que já vem sendo feito por parte parte do complexo partidário. É um fato de que o proletariado brasileiro está cada vez mais utilizando aplicativos de conversas como WhatsApp para trocar informações, coisa que ficou clara na eleição de 2018. Precisamos apostar ainda mais nesse meio e nas mídias de vídeo, tornando nosso conteúdo mais atraente e de fácil “consumo” para a classe trabalhadora, indo além do que já se faz atualmente. Também é necessário estudar meios de realizar o trabalho de propaganda tendo em mente a segurança das organizações e dos/as militantes do Partido, principalmente nesses tempos de crescente repressão e anticomunismo.

Ora, a proposta de centralizar e profissionalizar a agitação e propaganda nos meios virtuais colide brutalmente com as sabotagens e perseguição que instrumentos como Lavra Palavra, Revolushow, Classe Esquerda, canais de Jones Manoel e Gustavo Gaiofato, canais e produções menores de outros camaradas vêm sofrendo. Ou algum leitor já viu as páginas oficiais do partido compartilhando e divulgando esses conteúdos? Se existe divergência programática proveniente desses meios que escapam aos olhos da militância, que apontem concretamente os equívocos que justificam essa clara sabotagem, mas preferem ignorar as produções militantes enquanto instrumentalizam ferramentas como o ICP (Instituto Caio Prado), que tem um funcionamento, direção e editoriais decididos em paralelo ao restante da organização, sem possibilidade de qualquer participação da militância na utilização dessa ferramenta.

O XVI Congresso reafirma a necessidade de estarmos atuando em todos os espaços de luta. Como é possível nos posicionarmos sem ressalvas ao lado daqueles que não tem as pautas que nos envolvem como urgências políticas? Camaradas, lembremos de alguns casos na história recente de nosso complexo partidário para ilustrar a incoerência.

O conflito de urgências políticas que podemos observar em nossas fileiras, pode e deve ser exemplificado pelo contexto das eleições burguesas de 2022. No Rio de Janeiro, no dia 28/05 foi puxado um ato pela Coalizão Negra Por Direitos, contra o genocídio do povo preto, pelo fim das chacinas e por justiça por Genivaldo. O ato dividia a data com tarefas de campanha para o até então candidato Eduardo Serra, sendo privilegiado pelo Comitê Regional do Partido a panfletagem de campanha. Após disputa interna, estranhamente fica estabelecido que camaradas da baixada e zona oeste deveriam construir o ato, enquanto militantes das zonas norte e sul prioritariamente deveriam estar na panfletagem. Se o Partido Comunista Brasileiro deve estar onde as lutas populares estão, onde está a urgência política em pautar o fim do genocídio da população preta? Esse não foi um caso isolado. No dia 21 de julho ocorre mais uma das políticas de extermínio empreendidas por Claudio Castro, no complexo do Alemão são brutalmente assassinadas cerca de 18 pessoas, sendo esta uma das cinco maiores chacinas policiais na história do Estado do Rio de Janeiro. A chacina divide data com a agitação virtual da campanha da então candidata à presidência Sofia Manzano, o “tuitaço #Vote21”. Foi solicitado o adiamento dessa tarefa por entender que o momento não seria adequado, solicitação não atendida sob a justificativa de a morte de 18 pessoas em decorrência de violência policial seria um problema local, sem projeção nacional suficiente para que fosse necessário suspender a atividade eleitoral. 18 vidas na favela valem menos que tweets de campanha. Pudemos acompanhar copiosamente a agitação de campanha nas redes sociais do Eduardo Serra sem qualquer sensibilidade utilizando disparos de textos prontos com suas propostas sobre segurança em notícias ou pronunciamento de outras lideranças políticas acerca das chacinas, fato que incomodou muitos de nós nas fileiras do complexo partidário. Sem contar o fato de que, enquanto nosso candidato a deputado federal, Gustavo Pedro, focou toda sua campanha na Zona Oeste, o candidato ao governo do estado Eduardo Serra não se dignou a pisar uma única vez sequer na região durante toda a campanha.

Além disso, toda a campanha do candidato Thiago Coqueiro foi tocada de forma artesanal pelo partido, que não convidou o CNMO para o planejamento e simplesmente arremessou a tarefa no peito de 3 militantes que executaram junto com Coqueiro todo o trabalho de divulgação.

Camaradas, outro ponto fundamental precisamos ter cuidado sobre a disparidade apontada na urgência política entre militantes brancos do movimento estudantil e demais militantes negros. Lembremos que muitos que estavam e estão ao nosso lado em nossas tarefas, são militantes do Movimento Estudantil e Movimento de Bairro. Onde estavam os membros do Comitê Central residentes no Rio de Janeiro no ato de 7 de maio de 2021 no Jacarezinho contra a política de extermínio do Estado Burguês? É preciso ter em mente a não relativização do trabalho tocado no Movimento Estudantil, formado por jovens trabalhadores e trabalhadoras em espaços que produzem e reproduzem as desigualdades e opressões as quais somos submetidos cotidianamente.

Quanto ao salto qualitativo em nossa política de finanças, um vício comum de nossa atuação tem sido pensar as tarefas marginalizando um ponto central para a sua execução: as finanças. Nossa independência política se atrela à nossa capacidade de sermos financeiramente independentes. Tocamos a política de finanças ainda de forma muito artesanal e a política robusta de finanças que precisamos desenvolver, precisa vir acompanhada do debate qualificado sobre o que são as tarefas de finanças em um partido comunista, como devem ser feitas e em que medida tais políticas são efetivas no avanço de nossa linha política.

Como consta nas resoluções do XVI Congresso, os desafios que se apresentam na conjuntura que enfrentamos deve nos levar a construção de uma política de finanças criativa e ousada, capaz de possibilitar a construção material de nossa organização, concomitante a estruturação de nossa independência financeira, política com participação efetiva da militância de todo o complexo partidário nessa tarefa estratégica. A cotização financeira é destacada enquanto um dever de todo/a militante e um motivo de orgulho de cada camarada. Dentre as formas de levantamento de fundos estabelecidas no XVI Congresso é destacado que o Comitê Central deve estabelecer um sistema de cotização progressiva, com base nos rendimentos dos militantes. É sintomático que enfrentemos a não efetivação da cotização progressiva aprovada no congresso, pois os membros do comitê central dizem que não efetivaram a política aprovada, pois a sistematização dos salários e rendimentos dos membros, implicaria invasão dos contracheques. Soa cômico. Vale dizer que já apresentamos a solução de trabalharem faixas salariais para exigir a cotização de maneira progressiva.

Camaradas, não há qualquer fundamento em dizer que somos favoráveis ao racha ou que desejamos a quebra de trabalhos que vem sendo tocados, apesar dos percalços, formando novos quadros e ampliando a inserção do partido e seus coletivos em seus locais de atuação. O apontamento de que nossa militância não esteja protagonizando o movimento de insatisfação que vem se consolidando ou as suspeitas de que nós sequer tenhamos “sido chamados para a resenha” é leviano. Esse é um posicionamento infeliz, que reforça o papel secundário de pessoas pretas na política, no nosso caso, independente das posições que vêm sendo tomadas na disputa partidária. Somos nós, mulheres, negros e negras, indígenas, a comunidade LGBT+ que, inegavelmente, levamos o partido cada vez mais à esquerda.

Quando os camaradas citam exemplos de trabalhos locais sem sequer terem colocado os pés nesses trabalhos, ou no caso do Lima Barreto, pré-vestibular construído na Zona Oeste do Rio de Janeiro, onde Natália ensaiou participar da construção enquanto residia no Rio, os camaradas desrespeitam o trabalho orgânico, que vem sendo tocado mesmo diante da crise instalada no partido. A célula da Zona Oeste, a UJC e CNMO têm trabalhado muito na efetivação dessa tarefa ao mesmo tempo que têm acumulado suas próprias posições acerca da crise. Não existe racha que destruirá um trabalho real como aquele. Vale frisar, sequer existe um grupo que almeja destruir o trabalho positivo ou o próprio partido. O que existe é grande parte da base e pequena parte da direção lutando pelos rumos do partido no sentido da reconstrução revolucionária e contra o giro ao reformismo de quadros catedráticos do Comitê Central.

A arrogância, personalismo e certa falta de habilidade política, sobretudo quando as críticas perdem seu conteúdo político e ganham forma de rusgas pessoais, apontados podem ser questionados da ponte pra lá, quando os camaradas reduzem o debate às figuras de Jones Manoel e Ivan Pinheiro, quando camaradas de coletivos também são sistematicamente alvos do burocratismo e silenciamento do Comitê Central.

Os camaradas erram ao questionarem a atuação do camarada Ivan forjada em um processo de ultravalorização do trabalho militante de homens brancos, reproduzindo o conteúdo de sua crítica ao atribuir unicamente ao camarada uma ausência de capilaridade política relevante para a classe trabalhadora que deveria ser resultado da luta contra o liquidacionismo do Partido. A ausência de grande relevância social, sobretudo nos processos que enfrentamos na história recente de nosso país, é de responsabilidade de todos nós que estamos nas fileiras do complexo partidário. Os acertos de 1992 não são louros de uma única figura política, os erros e insucessos também não, sejamos justos. Atacam o camarada Ivan, acusando-o de fracionista e de querer acabar com o trabalho das bases por “não ver de perto”, denotando que desconhecem o histórico de luta do camarada que é trabalhador, bancário importantíssimo para organização de sua categoria, além de suas inquestionáveis contribuições para a reconstrução revolucionária contra os verdadeiros liquidacionistas que tentaram acabar com nosso partido na década de 90 e apenas não saíram vitoriosos devido a luta que Ivan, Zuleide, Horácio Macedo e diversos outros camaradas travaram frontalmente. Aqui não estamos em posição de fazer uma defesa ampla dos camaradas atacados pessoalmente naquele texto, pois acreditamos que eles têm autonomia e plena capacidade para tratar ponto a ponto cada acusação. Os camaradas trazem do começo ao fim do texto a defesa do obreirismo, tarefismo, o contato direto com o trabalho prático como método sobredeterminante e nisso, mostram-se incoerentes ao utilizarem-se do maniqueísmo para escolher o lado dos acadêmicos do Comitê Central, como se estes fossem os baluartes de defesa da unidade partidária, ao mesmo tempo que atuam para silenciar as bases e manter seus cargos pétreos.

Não há horizonte de recuo dos trabalhos, estes apontados somente pelo acompanhamento distante de Ivan, mas que a colocação caberia perfeitamente a muitos membros do Comitê Central. Não há negligência quanto a capacidade política dos militantes dos coletivos, não estamos aqui e falamos por nós, assim como vocês destacaram que falam apenas por vocês na redação de seu texto. A diminuição da nossa importância e subestimo de nossa inteligência e trabalho político partem dos camaradas ao não considerarem que assim como nós, mais militantes estão se posicionando independentemente das tentativas de personalizarem o debate em dois únicos militantes e em se furtarem de buscar os espaços internos do Minervino, como nós buscamos solicitando à Direção Nacional do CNMO um esgotamento do debate dentro do coletivo antes que posições fossem externalizadas. É preciso dizer que consideramos injusto o peso de dois camaradas da Nacional publicarem um texto, nos mesmos moldes do LGBT Comunista, sem consultar as bases anteriormente. O posicionamento de vocês, definitivamente, não é o posicionamento da totalidade do coletivo.

Os apontamentos dos camaradas nos trazem novamente a tônica da ausência dos espaços internos para amplificar o debate que nos interessa: por que para o camarada Geraldinho, por quem nutrimos profundo respeito e admiração, os espaços de comunicação interno não são abertos de mesmo modo como ocorre para Mauro Iasi? Por que o Geraldinho, assim como vocês e nós, precisa recorrer ao uso de redes sociais para alcançar o complexo partidário com suas reflexões acerca dos desafios que se apresentam ao Partido Comunista Brasileiro? Não adianta, camaradas, recorrermos ao personalismo quando o problema é organizativo e político. Não é sobre o convencimento das bases por parte de um ou outro militante, trata-se de um processo exaustivo de síntese das problemáticas que vocês mesmos citaram no texto. Não nos furtaremos da disputa de rumos da construção de um partido que se pretende revolucionário.

Sobre os militantes que constituem nossa história nos bastidores e são constantemente invisibilizados, precisamos discutir coletivamente um problema histórico do Partido em lidar com sua história e memória. Não é responsabilidade de um ou dois camaradas isoladamente, mas um problema em que temos investido poucos esforços nesses 101 anos para combater. Nossos camaradas não devem ser exaltados somente em momentos de celebração, tampouco em momentos de disputa interna. Figuras como Geraldinho, Ivan, Clóvis Moura, Thereza Santos, Zé Maria, Diva Moreira, Eraldo Bulhões, Zuleide, Marighella e tantos outros e outras que contribuíram e contribuem ativamente para construção desse partido devem ser incorporados cotidianamente em nossa prática cotidiana e no nosso empenho de ousar sonhar futuros e, por isso, nós fazemos coro com a construção do XVII Congresso Extraordinário do PCB com participação dos coletivos.

Precisamos traçar a forma deste congresso, como seria a participação dos coletivos, como se daria o chamamento deste necessário congresso e toda a estrutura que necessitaríamos mobilizar para fazer acontecer. Sabemos que existe uma conferência prometida para 2024, para a qual sequer existem pré-teses escritas ou tribunas abertas e, sabemos também que a conferência não seria capaz de alterar a conclusão dos processos disciplinares instaurados com fins de perseguição política, tampouco, deliberar pelo retorno de militantes injustamente expulsos ou destituídos da direção. Precisamos compreender, buscar a verdade sobre o caso do “desrecrutamento” de Gustavo Gaiofato, que, diga-se de passagem, já estava recrutado e participando normalmente das reuniões de célula, a destituição sem explicações de Gabriel Colombo da secretária de juventude do CR-SP, da destituição de Jones Manoel do CR-PE e do CC e das demais arbitrariedades cometidas pela direção do PCB nos últimos tempos. Por isso, reivindicamos o XVII Congresso Extraordinário e a reconstrução revolucionária do Partido Comunista Brasileiro, só assim poderemos ter segurança de que o potencial revolucionário do PCB ainda está de pé e de que através dessa ferramenta seremos capazes de, junto à classe trabalhadora brasileira, construir as condições subjetivas da Revolução Socialista Brasileira.